Indiferença
Do alto do viaduto o suicida pensa:
Como chegou aquele ponto?
O que aconteceu a sua vida?
Em que se transformou?
Rasga suas fotografias, suas memórias
Nada mais parece valer, tudo é vazio
Abaixo de seus pés os carros engarrafados
Buzinas soam altas e abafam as batidas de seu coração
Ninguém nota aquela figura solitária
Derrama lágrimas silenciosas no caos urbano
As pessoas deixaram de se importar
Deixaram de enxergar o outro ao lado
Tornaram-se o centro do mundo ensimesmado
Agora machucam sem sentir
Sentem somente suas necessidades
Ensurdecem-se aos gritos de socorro
Aos lamentos de tristeza alheia
A dor é invisível na multidão
Fingem não notar o corpo que ameaça se atirar
Acham mais fácil não se sensibilizar
O trânsito está parado e sempre há uma esperança
Ele espera alguém que lhe estenda uma mão
Que lhe diga: “Não pule não!”
Que lhe afague a emoção
Mas a sua presença é transparente
As pessoas preferem não se envolver
O mundo burguês sobressai mais
Só o menino que olha pela janela do carro não entende
Pergunta-se: o que fará aquele homem?
Voará da ponte como o super-homem?
A vida não é um retrato 3X4
A existência não passa em preto e branco
Os fatos têm cores múltiplas
A humanidade esqueceu o sentido de estar na terra
As razões por que vivemos
A urgência de tornar esse mundo melhor
Preocupar-se com o outro
Quem é louco?
O que olha o pôr do sol e chora
Triste e emocionado por mais um dia findo
Quem é louco?
Aquele que procura nos olhos de outrem
O motivo de sua significação
Quem é louco? Eu quero ser louco
Quero salvar o suicida
Porque se não formos todos loucos,
Seremos todos suicidas.