Assassínio

“Todos nós matamos em pensamento,

Mas só o autor, esse monstro, põe seus crimes no papel, e os publica.”

(Luís Fernando Veríssimo)

Acabo de enterrar a inspiração numa cova rasa

Cavada com a espátula que usei pra moldar meu ultimo poema torto.

Morto! - Assim deixei o dia.

Feita de risos e colorantes, antes

Seus cabelos foram cortados

Os óculos retirados

- Deixei-a cega e banguela!

Roubei-lhe a alegria

A alergia, a maestria das linhas.

Levei-lhe a solidão

O bom coração, a saudade pura.

Clausura sua agora a cova de meu peito!

Sem enjôos e nojos.

Sem literatura boa.

Não ao poeta louco!

Não ao mundo louco!

Não a letra morta!

A palavra santa!

Amo minha escrita, minhas asneiras.

Contudo, o que sinto abriu mão de ser lido,

Virar livros,

Conquistar estantes e poeiras.

Demasiado ato por amar. Destarte, do crime sou inocente.

Quiçá um dia entenda-me.

Quiçá vontade esta tu também sentes.