VERSOS NA PRIMEIRA PESSOA

Eu acredito que sempre soube que, comigo, seria assim.

Que iria virando esquinas, mas que jamais esqueceria as ruas,

e que os tons cinza, como mapas encardidos nas paredes nuas,

trariam consigo os risos ocultos das outras cores, por fim.

Com essas cores fui pintando a imagem da cidade conhecida,

decompondo-a nos detalhes de cada revelado recanto,

sentindo-lhe o pulsar subterrâneo e o vigoroso encanto

com que se desnudava e abria aos meus passos, oferecida...

Por isso foi andando que a penetrei, num lento progredir.

Conheci-lhe todos os meios, todas as horas, todos os cheiros,

quem a erguia e compunha, e os passantes apenas, romeiros

de um caminho já pronto para se percorrer, e se usufruir.

Caminhei a cidade até á exaustão, até a saturar dos meus passos.

Até reconhecer as caras daqueles que a amavam da mesma forma,

sem obediência a nenhuma regra, nem seguindo qualquer norma,

mas, como eu, apreciando-lhe as feições, decorando-lhe os traços.

E foi na cidade, e nos seus mistérios e tantos segredos,

que me soube maior do que me sabia, ou apenas adivinhava,

e percebi que haveria ainda uma outra estrada, jamais sonhada,

por onde ainda me lançaria afoito, apesar dos medos...

Setembro de 2009

Henrique Mendes
Enviado por Henrique Mendes em 09/09/2009
Reeditado em 02/02/2020
Código do texto: T1801127
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