AFINAÇÃO
Vem, minha alma...
Eu que te espantei com as minhas agruras e horrores
De se saber preso às coisas que ainda não aprendi
No mundo do descer terreno,
Onde mulher e filhos, amigos e inimigos tantos
Se ajuntam e se ajustam em tormentas e calmarias
Repartindo com o meu pensamento
Pedaços de guerras que nem sei...
Longe de mim,
Vagueias pelo cosmo infinito
Onde colhes as belezas que os meus olhos terrenos
Almejam ver
É doloroso ver-se preso na prisão sem muros,
Voando para baixo ou para cima, mas,
Invariavelmente no meio,
No abrir dos olhos para a luz do Sol
Que anuncia mais um dia da conta dos dias que são tantos
Para a linha do horizonte que se distancia da marcha dos passos
Que aqui são dados pesados;
E cheio de dores o corpo
Que se move lento
Feito a própria peia, a cadeia de si,
Que só agora estou aprendendo alçá-la do chão,
E convido-te, minha fluida alma frágil,
Venhas sem espanto ver os horrores que vejo neste mister,
Venhas cantar para mim,
Venhas molhar os meus olhos
E a minha garganta
Na secura desse deserto, companheira de infinito,
Metade iluminada de mim, semente da perfeição.
Sopra do hálito que te fez assim tão fugidia dos meus limites densos
Nas toscas asas que emergem no Humano nascituro dos abismos
Que me ensinaram todas as coisas da escuridão e todos aos ais
Que a dor pode suscitar e pressente na garganta o grito
Do parto para a Luz.
Vem contar-me das coisas que não sei,
Vem contar-me do Universo que está imerso
No fluido que os meus olhos terrenos não vêem,
Vem contar-me das sinfonias e sons
Que nem Vivaldi, nem Mozart, Beethoven ou Bach sonharam existir!
Venhas, com o prenúncio do vôo livre,
E traz-me do tesouro Divino,
Apenas uma gota do Amor:
Revela-me o segredo de toda a existência,
Dá-me a compreensão da dimensão do Amar
Eu quero ouvir a regência do silêncio
Que grita além dos limites dos meus olhos
Toda a música nem sonhada.
Ainda que eu me demore
Que não seja
Por não saber voar...