Sangue sem perdão
A chuva batia na vidraça
E a dentista,
A jornada começava
O verme pelo chão rastejava
A goteira pelo teto respingava
O cliente no consultório adentrava
Pele pálida,
Boca reta arroxeada
Diante dos seus olhos
Horror e repulsa, eram notórios
Na insensatez
Permitia dentes pálidos
Tártaro e cáries se alastravam
E a dentista
Superava a timidez
Num instante,
Um sonho, uma ilusão
Sonhava que beijava a boca em podridão
Abraçava-o, tocava-o com as mãos
Sentia êxtase, sentia paixão
Diante da ilusão cultivada
Viu o verme
Que se alinhava
No jaleco estendido
Gotas vermelhas escorridas
Acordou em sobressalto
Tomada de terror
Seu cliente observava
A paisagem exterior
Gotas de suor
Bater de dentes e tremor
A dentista nauseava
Aquele ser inferior
Não aceitou o trabalho
Recusou a profissão
Abriu as portas e correu
A rua foi a solução
O cliente a seguiu
Perseguiu e encontrou
Na esquina uma sombra
Atrás do carro se virou
Nervos e músculos
Fizeram o trabalho
Pelas mãos do ser lacaio
A pobre sucumbia
O verme rastejava
Alma vazia, alheio a situação,
As gotas que caiam
Eram sangue, sem perdão