PERSPECTIVAS
O ônibus carrega o sono
Achatado nas cadeiras.
Alguma voracidade
Chupa laranjas
Descascadas na hora.
O trocador tem cheias
As mãos de notas dobradas
E anota as distâncias
Dos passageiros intermediários
Trocadas em miúdos.
Um velho cochila
Segurando um guarda-chuva
Cinzento das mágoas do tempo,
Enquanto corre a paisagem
No verde dos olhos da moça
Que resiste ao não sonhar.
Sinto a vida passando
No volante e nas rodas
E no piscar atento
Do motorista autômato.
E flui a vida
No sonho do velho esquecido
Surdo ao choro da criança
Indócil no banco detrás.
A mão enrugada
Segura a valise no colo senil
A saudade impera negra
Como o asfalto.