Retrato de mim

Eu sou mesmo a incerteza,

a controvérsia

e a loucura...

Em cada tempo sou apenas eu mesma,

mas de formas diferentes.

Eu sou a revolta,

o vento,

o punhal,

a casa escura

mal-assombrada...

e sou o sono,

sou a rua,

as estrelas, tão sozinhas,

a lua, tão pequena...

a torre de um castelo abandonado,

os espelhos quebrados,

que eu quebrei...

sou a imagem e o som das cidades,

a lua nova,

a alma insone,

um gato preto miando no muro,

o sangue pingando no asfalto,

a respiração carregada...

o sonho livre...

do naufrágio à partida.

Sou o meu tempo num tempo à parte,

sou a amiga,

sou o sonho das luzes azuis.

Só não sou o que não existe...

porque tudo que existe é meu.

Sou principalmente o nada,

porque o nada pode ser tudo em mim

quando eu me esqueço do que sou.

O nada é aquilo em que não se acredita

porque não se conhece.

E assim, às vezes sou o nada...

infinitamente vazia e má...

quando descubro que sou a incerteza

desde o dia em que comecei a ser.

Sou apenas o vento...

e não posso voar.