Fogo-fátuo

Sobrou um silêncio desmembrado

Frente aos olhos, sobre os corpos, entre as bocas.

Sobrou o toque despedaçado

Em outros toques,

E o esmero se esvaiu com toda a dor

Que se expandia e se alastrava

E não doía

E a estrada fez tantas curvas

Que o caminho não fazia mais sentido

E o carinho era um carinho entorpecido

Quase que totalmente forjado em aço e osso.

Do perigoso só sobrou o lado errado

Tão dicotômico como o papel do arauto

E esperavam o calor sólido dos peitos

E o que sobrou, dois corpos gélidos no asfalto

Sobrou o mundo definhando, definhando

E a tortura da espera se afastando

E o desalentado corpo sacudindo

Tremeluzindo, tremulando, se extinguindo

Como a chama de uma vela que se esvai,

Fogo-fátuo, brilho farto,

Mas tão breve!

Tão breve que meus ossos se esboroaram

E quando meus olhos enfim se abriram

Encontraram tão de pronto a neve

Que novamente se tornaram cegos

Sou, eu, uma aparência única

Que por dentro revestiu-se de vazio

E minhas entranhas são contracorrentes

E minhas resenhas não passam de frio

De puro frio!

E é difícil refletir o mundo

Que se reflete sobre minha cabeça

Então mergulho em um oceano quente,

Em um oceano escuro e desconhecido.

E enquanto submerso estou em paz.

Enquanto submerso sobrevivo.

E na minha vida não há mais que treva

E na minha treva tudo é toda a morte.

Não por você e não por mim, me mato.

Repetidas vezes, porém, saio ileso

E de vez em quando em fogo desato

Que o peito queima seco e embriagado,

Mas já não me engano,

Fato, fogo-fátuo

Joao L Terrezo
Enviado por Joao L Terrezo em 28/06/2009
Código do texto: T1672122