O AUTO-FALANTE DA PRAÇA

Começo de tarde.

No interior da praça,

um coração disparado

à espera da namorada ouvida

apenas por um só bilhete,

julgou-se o centro de tudo.

Em sua volta, tudo acontece!

Há namorados na praça.

No interior dos casais,

corações acostumados

à espera da voz de Zé Veludo

dedicar em alto e bom som

as mal rabiscadas linhas.

A tarde seria curta.

Abelardo tocou Mariazinha

que falava qual os garranchos do bilhete.

Mariazinha acalmou Abelardo

tão afobado quanto seu olhar sem vírgulas.

E cravaram juras de amor na árvore,

testemunha marcada e sofredora

pela tatuagem de um canivete.

E morderam pipocas como nuvens

como quem salga a intimidade

do namoro de fim de tarde.

Seis da noite.

Nas casas, em volta da praça,

as invejosas, quase beatas,

desacostumaram os calos dos cotovelos

e abandonam as janelas de olhos espichados

para os namorados que cochilam

respeitosos como a tarde.

Mas, ainda acham imoral,

o toque das mãos nas mãos

enquanto os dedos se enroscam

de par em par, em casais.

Noite.

Contrariando a voz das ave-marias,

na praça, quase vazia,

Mariazinha, afogueada, sem palavras nas mãos

marcou e cumpriu o prometido.

Abelardo, carregado, de mochila cheia nas costas

carregou-a para o desacostumado

mundo, sem a voz de Zé Veludo.