Sereias

Me lembro perfeitamente,

De duas tias encalhadas e ressentidas.

Ficavam à espreita no fogão à lenha,

Conversando em códigos e sinais estranhos.

Nunca soubemos do que falavam.

Já se foram a algúm tempo.

Mas lembro-me de seu olhar desesperado,

De suas malhas jogadas sobre os ombros,

E de suas alturas um pouco anormais.

Quando criança queria entendê-las,

Mas nunca deixaram chegar muito perto.

Eram cuéis nas observações,

Especialmente se alguma moça se perdia.

Havia reprovação e prazer na fala.

Provavelmente não eram felizes.

Talvêz por isso perdiam,

Tantas horas desfiando o rosário.

Morreram, mas não houve chôro.

Acho que por serem tão alheias.

Sentia-se um suspiro de alívio,

Quando elas foram enterradas.

Eu fiquei no meu canto,

Querendo uma resposta convincente,

Que me justificasse a existência dessas almas,

Que ninguém quis abraçar.

Hoje acho que entendo um pouco.

EDUARDO PAIXÃO
Enviado por EDUARDO PAIXÃO em 24/05/2006
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