O MEU SILENCIO - 2
( REFEITO A PARTIR DO TEXTO IMEDIATAMENTE ANTERIOR:
"O MEU SILÊNCIO" )
Fui caindo no silêncio
como quem mergulha de noite
para uma piscina invisível, lá em baixo.
Foi como pular duma prancha, ás cegas,
para uma água escura onde não chegava.
Firmei o corpo, preparado,
para um impacto que não acontecia.
A elegância do movimento sumiu
quando os músculos gritaram dúvidas
á eternidade imensa, intranqüilos,
e da queda sobrou apenas a angústia.
A suprema angústia de cair sempre,
numa vertigem de saber-me despencando
sem saber até onde ou quando.
Sem pontos de referência
capazes de satisfazer a razão,
que pudessem dizer-me
se era para baixo, que caía.
Depois, os gestos tardios, instintivos,
dum arrependimento já sem lugar
perante o fato irreversível.
A queda sem preparo viável,
sem tempo para acabar,
com todas as memórias destruídas
menos as do salto ele mesmo.
Fui caindo, alheando-me de tudo,
desfocado de todos os sons em redor
e do burburinho dos passantes
até que, finalmente, o silêncio chegou
como uma cortina negra de desinteresse
cobrindo o mundo,
num estrondo líquido de carne castigada
e respingos de prata chovendo longe,
audíveis na falta de outros sons.
Um silêncio que não fez sentido,
assim instalado entre os sons quotidianos,
pesado e amorfo. Inútil.
Mas foi na quietude do não acontecer,
no tempo alterado da percepção falha
onde pensamentos surgiam como vagalumes impossíveis,
e nos velhos gestos renascidos das raízes mais profundas,
que as horas se uniram e cresceram contra mim
- e descobri que tinha de apressar o meu regresso
antes que o tempo me lambesse a alma
e curasse aquelas feridas que eu queria ter
doendo baixinho como um fado...
Voltei.