Dois

Dois:

onde são revelados muitos segredos ignorados pelos cardiologistas.

Já fazia um mês.

Por um mês ele caminhou, sozinho, sem achar saída.

Ele, mesmo assim, nunca havia estado onde estava.

O coração é vasto, e desconhecido.

Mesmo sem nunca ter estado lá, ele reconheceu muitas coisas:

pulsações estranhas quando perto d'Ela, vindas de além das paredes;

o silêncio diante do primeiro filho, quando o viu pela primeira vez;

as vozes quando em dúvida, sempre sábias, sempre desesperadas;

os vultos dos pesadelos.

Afinal, aquele era Seu Coração.

Ele lembrava das aulas de biologia,

mas já havia visto milhares de átrios e milhares de ventrículos.

Todos tortuosos, todos iluminados, todos diferentes.

Alguns eram a materialização da dor, ele percebeu.

Ele riu de suas memórias de infância,

a despeito do hipocampo.

Ele riu de suas emoções com mulheres do passado,

a despeito das amígdalas.

(Rá, neurocirurgiões, Rá!)

Ele riu, mas também chorou, quando percebeu que não queria sair de lá.

E ele sentou, quando achou assento,

e só então percebeu,

que não reinava. Percebeu que,

por mais que aquele fosse o seu coração,

ele era apenas um visitante.