MAURA, A COBRA LOUCA,
Este antigo poema é quase uma brincadeira, ou pelo menos um bom humor "non-sense".
MAURA
Maura, a cobra louca, voava
Pelos espaços siderais,
Imensa, insana, fantástica,
Os olhos fulgentes e vagos,
Felizes e dissociados,
Fitando o fundo do infinito,
E com o riso sardônico.
Essa louca tinha essa mania;
Havia séculos vagava assim.
Não se detinha, não comia,
Apenas serpeava e serpeava
Pelos espaços do céu;
Nem se sabia havia quanto nascera.
Era um prazer orgíaco o seu:
Correr, célere, numa reta
E única direção, sem desvios,
Pelos vazios da amplidão,
Saracoteando o corpo descomunal,
Driblando entre as estrelas.
Costumava vir à Terra, vez em quando,
Ao chão que abrigara o ovo
De que nascera, um dia.
E aí então corria, corria, corria,
Pondo medo às gentes, às criaturas.
Ficava assim, como uma lança doida,
Ziguezagueando entre os pinheiros
E entre os picos da serrania.
Serpeava em vigorosas gingadas,
Dançava, voava, flutuava,
Sempre lúdica e incessante,
Sem um sibilo, sem um insulto.
Serpeava, que serpear
Era o seu mais cálido afã.
Dançava, como aquela pobre louca
(conheci-a, certa feita)
Que dançava entre o povo, na rua.
“Olha a Maura!”, gritavam os moleques,
E corriam, quando ela ainda bem longe;
Mas o sabiam desnecessário –
Não era má a serpente,
Apenas doida, demente.
20.02.86