Saída
Decidi sair,
sair desse corpo que me abriga,
sair desse moquifo que habito,
sair desse pesadelo que me sonha,
sair dessa música que me descompassa,
sair dessa poça d'água onde me afogo!
É, Sr. Deus, sabe que não tenho fé alguma,
sabe bem que sou um meio-agnóstico/ateu,
o sagrado pra mim é tão profano em significado,
que orações me parecem ladainhas enfadonhas,
então só estou comunicando ao síndico do universo,
já que assim é representado pelos crédulos:
vou sair, por bem ou por mal, com ou sem sua existência,
com ou sem sua anuência, vou sair, é ponto firmado!
Vou sair trancando a porta no rebate de uma mão,
deixando na vacância minha presença sempre ausente,
sem recisão de contrato, sem indenização ou fiador,
vou sair com barulho, sem ser de fininho, sem ser rasteiro,
vou sair e dane-se quem estiver pela frente, não vou parar,
não vou olhar para trás, não vou mais me importar!
vou sair indiferente, insensível, inócuo, inodoro, insosso,
vou sair impermeável, indelével, impertinente, indignado,
vou sair sem explicações de motivos, sem racionalidades vãs,
vou sair da vida sem ser para a história, ou da morte para o céu,
vou sair para beber e cair em algum coma alcóolico sem arrependimentos,
vou sair de qualquer consciência, sentimento ou ancoragem,
vou simplesmente sair e não será para baladas ou viagens turísticas,
vou sair de mim mesmo para não mais me encontrar,
pode colocar o aviso nos classificados: Aluga-se!
Não vou voltar!