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soltam-se-me as palavras
que sejam macias as palavras
que o pensamento flua com nitidez
que os sonhos sejam o leito onde me deito
que as utopias sejam a minha doce razão
que as saudades sejam a química para amar
que o coração bata ao compasso da liberdade
todo o corpo tem movimento
todos os sentidos despertos e prontos para me guiarem na escuridão
embebedo-me do ar que respiro
mesmo perante o sufoco das horas que se esvaem
correm apressadas numa maratona do tempo
clique, cloque
o ponteiro voa
plof
o presente já não o é
o futuro foi-se
mas que som é este
medidor do tempo por que obra?
terá um segundo que o ser?
clique, cloque
os nervos à flor da pele
tenho que correr mais que o ponteiro
para acertar o meu próprio tempo
ele finda num número que eu não sei
que ficará registado num punhado de terra
e nem esse nada de terra será meu
porque não tem malmequeres
meu amor, por que arrancas o malmequer da terra?
depressa morrerá nas tuas mãos
o tempo conta
o ponteiro do relógio em constante animação
frenético
conta-me histórias de malmequeres eternos
diz-me que as flores nos escutam
que choram que sorriem
diz-me que os homens choram e sorriem
com verdadeira emoção
que não arrancam malmequeres da terra
diz-me que as palavras não se pronunciam
que os olhos e as mãos e todo o corpo são palavras
que a comunicação é muito mais que lábios que murmuram
diz-me palavras doces
emociona-me
chora e sorri
onde está a essência da matéria?
os vermes estão prestes a devorar a carne apodrecida pelos ponteiros do relógio
e o que fica?
nada rigorosamente nada