Chuva fina, uma fria garoa,
Atravesso a Central, Gamboa,
Deixo o carro a passos largos, com pressa.
Chego à Rio Branco sob promessa,
Com a paixão condenada das ruelas.
Meus pés ofegantes acham o tal beco,
Lugarejo estreito, árido, seco.
Moradia oculta das Cinderelas,
Doce oásis é o Beco das Cancelas.
 
Rompo os degraus da apertada viela,
Descubro um salão, sagrada capela.
Névoa, sons, aromas, uma aquarela
Onde meus olhos pisam com cautela.
Um brilho vem com o prenúncio: é ela!
Diz o antigo latim que é a sábia,
Mas para o meu coração é a bela.
Na penumbra, como a luz de uma vela,
Reluz no escuro a linda Mirela.
 
Eu me confesso num beijo tesudo.
Rezo ao teu corpo, ofídio desnudo.
Bebo teu cheiro, perfume da tarde;
Respiro teu gosto, veneno que arde.
Meu ego faminto cresce ao teu toque,
Invado o teu sexo, ondas de choque.
 
Viajamos juntos ao prazer extremo,
Aprendi contigo o gozo supremo.
Gozar assim é como ver a morte,
Dois náufragos soltos à própria sorte.
Vejo na penumbra a luz de uma vela,
Reluz no escuro a linda Mirela.
Alexandre Coslei
Enviado por Alexandre Coslei em 30/04/2009
Reeditado em 26/02/2016
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