RETRATO DA SOLIDÃO
Sentir-se um hiato, um clandestino,
Um espaço nulo, sem forma ou dimensão...
Uma travessia sem rumo, um nauta perdido,
Um corpo sem alma e coração.
Olhar em volta, aguçar o olfato
E nada mais reconhecer...
Ser anônimo entre os agonizantes,
Um tuaregue das areias escaldantes.
Perguntar-se e responder-se,
Recordar a ausência de ninguém...
Andar sem caminhar, viver sem identidade,
Executar o próprio réquiem.
Ver uma flor e senti-la morta,
Ter uma nota e não poder pô-la na pauta,
Uma palavra e ninguém para dizer...
Preencher o todo de vazio.
Ansiar por vozes e notícias de outros mundos,
Querer até mesmo um empurrão....
Arranhar-se, abraçar-se, matar-se,
Enlaçar os dedos, apertar a própria mão.
Escutar de si o eco nas paredes,
Viver noites brancas, cobertas de antigo pó...
As janelas abertas, as portas sem trancas
Mas sem entradas nem saídas... Só.
Ter febre, mergulhar na loucura,
Visitar o Inferno de Dante!
Dedicar sua ternura a um objeto,
Fazer do choro, do poema, um amante.