PAU NO SUPEREGO

Quando pequenina

me ensinaram o medo

de fantasmas,

de soldados,

de bêbados,

de deus.

Cresci e exorcizei

quase tudo em mim.

Mas um medo ficou,

atrapalhando os sonhos meus,

o pior deles:

o medo de um deus.

Quando te conheci,

através das palavras,

as mais bonitas,

mais certas, mais justas,

sentindo tua alma linda

e a graça infinda

dos falares teus,

retornei à infância

e criei tua imagem:

a imagem de um deus.

E ao lado do afeto,

da ternura,

do encantamento leve e ledo,

instalou-se em mim

o sentimento indesejado:

medo.

Medo de entender

teus apelos singelos,

teus recados cifrados,

e o amor que parecia entregue

em termos disfarçados.

Como poderia eu,

frágil e tão pequena

mal podendo te alcançar,

imaginar mesmo de longe

que pudesse um deus me amar?

Quanto tempo perdi

e quanto me enganei!

Quanto sofri, chorei,

procurando amor

em outros braços,

enquanto desejava

teus abraços!

Hoje tudo acabou,

nenhum fantasma...

Tudo tão claro,

a alma transparente

sem nenhum torpor.

Exorcizei o último deus,

me libertei,

de ti, de mim,

e do jugo do amor...

Sal
Enviado por Sal em 29/04/2006
Código do texto: T147443