PAU NO SUPEREGO
Quando pequenina
me ensinaram o medo
de fantasmas,
de soldados,
de bêbados,
de deus.
Cresci e exorcizei
quase tudo em mim.
Mas um medo ficou,
atrapalhando os sonhos meus,
o pior deles:
o medo de um deus.
Quando te conheci,
através das palavras,
as mais bonitas,
mais certas, mais justas,
sentindo tua alma linda
e a graça infinda
dos falares teus,
retornei à infância
e criei tua imagem:
a imagem de um deus.
E ao lado do afeto,
da ternura,
do encantamento leve e ledo,
instalou-se em mim
o sentimento indesejado:
medo.
Medo de entender
teus apelos singelos,
teus recados cifrados,
e o amor que parecia entregue
em termos disfarçados.
Como poderia eu,
frágil e tão pequena
mal podendo te alcançar,
imaginar mesmo de longe
que pudesse um deus me amar?
Quanto tempo perdi
e quanto me enganei!
Quanto sofri, chorei,
procurando amor
em outros braços,
enquanto desejava
teus abraços!
Hoje tudo acabou,
nenhum fantasma...
Tudo tão claro,
a alma transparente
sem nenhum torpor.
Exorcizei o último deus,
me libertei,
de ti, de mim,
e do jugo do amor...