Quase vingança
Eu tive a ilusão de que te amar bastava;
e suspendi teu corpo,
tua alma,
teus ócios e anseios,
certezas e artimanhas.
Tão somente pretendi a percepção
(tua)
da sorte que te rondava,
da gravidade do aceite... da alegria do sim.
Mas tu me deixaste partir espoliada de lembranças,
árida de inspiração,
de querer bem,
à míngua de adeus...
Maior ilusão foi roubar teu prazer,
traquinar com teu desejo de ver,
não poder tocar,
ou levar prá casa,
qual doce raro
em vitrine cara,
pedra exótica, lua nova...
(Ah, como, se ando a te suspender em lágrimas
e lençóis amassados,
em outros corpos,
em sorrisos falsos,
em perfume antigo...?)
Serei bruxa, então!
Verruga, chapéu, poções e vassoura
- tudo encantado -
e uma caixa de costura;
tu me dirás bela;
teu corpo
de novo
suspenso
cairá de um bem alto céu,
tua sorte transfigurada - pedaço a pedaço de ti!
Eu te reconstituirei a algodão e aço, líquidos cicatrizantes
e gargalhadas,
e até o fim da memória dos tempos carregarás a certeza:
eu,
minhas lágrimas e lembranças,
minha agulha e minha linha,
minha fingida indiferença,
somos,
todas,
uma
só.