VERSOS NA CASA DE DEUS.
VERSOS NA CASA DE DEUS
Ontem eu fui à Capela ...
Por que motivo eu não sei.
Que sedução fora aquela?
Creio até que me enganei.
Orações não fiz, talvez
Rezar eu nem mais soubesse.
Fui ter com Deus outra vez
Mas não fiz nenhuma prece.
Parei à entrada, nervoso,
Com medo de alguém me ver.
E se o Todo-Poderoso
Não fosse me receber?
Talvez na sua revolta
O bondoso Padre Eterno
Me despedisse, de volta,
As profundezas do inferno.
Temeroso, abri a porta
E me senti vacilar
Minha fé já estava morta
Que fora eu ali buscar?
Quis me afastar, tive medo
De encontrar no casarão
Um padre erguendo o seu dedo
Em sinal de acusação.
Eu te acuso - me diria
Com toda a sua eloqüência.
As noites de boemia
Te pesam na consciência.
Pelo céu és condenado
Ao inferno dos ateus!
É terrível teu pecado
Pois te esqueceste de Deus
Falaria ele a verdade?
Mas ... eu me julgo inocente ...
Dizei-me, Deus, por piedade,
Será que padre não mente?
É falso, Deus me proteja.
São palavras vis, ingratas.
Há Deus aqui nesta igreja
E nas minhas serenatas.
Por que razão, padre, acusas
As minhas tristes serenatas?
Além de versos e musas,
Deus está nas minhas festas!
Há Deus nas noites de lua,
No bojo de um violão.
Há Deus nos ébrios da rua,
Há Deus num samba-canção.
Deus protege os trovadores
E as canções lhe fazem bem.
Tu não sabes que há cantores
No reino dos céus também?
Nunca ouviste, com certeza,
Os cantos dos serafins
Que são iguais, em beleza,
Às vozes dos querubins.
E por certo desconheces
Que o “Glória a Deus nas alturas”
É louvor a Deus, em prece,.
Dessas meigas criaturas.
Não te agradam violões
Porque os cantores divinos
Se utilizam nas canções
De harpas, liras e violinos!
Harpas são para os artistas
E a violinos para os nobres.
Os violões saudosistas
São dos seresteiros pobres.
Mas, para mim, reverendo,
Violões de serenatas
Não ficam nada devendo
Às liras aristocratas.
Deus que está dentro de mim,
Deus que está nesta Capela,
Há de saber por que vim
Me ajoelhar dentro dela.
Não me amedronta a verdade.
Eu sei que estou inocente!
Dizei-me, Deus, por piedade,
Será que padre não mente?
JoãoBosco Costa Marques.