AMARALÍNGUA
- de como poderia ter nascido um beijo de língua -
A língua,
na convexidade duma colher,
fez-lhe cóssegas nos pés
e desassossegou coxas;
lenta,
ereta e eleita ao pé-do-umbigo,
sorriu-lhe na graça tímida
ao desencabular o siso;
mansa,
molhada entre dobras e bordas,
gastou-se nos pelos raspados
na prova do molho madeira;
insana,
consciente do gosto que há no paladar,
parou de salgar a linha das costas
no primor do corpo invertido;
mundana,
apaixonada pela boca, única entre tantas,
guarda saliva de palavras úmidas
para babar no beijo primeiro;
invadida,
acasalada pela antropofagia da alma crua,
encaixou-se tão natural e simples
no beijo de língua composto.