LAGARTIXAS CHOCANDO NAS PANELAS

Tinha desejos de voltar ao passado.

Conseguiu.

Viu como tudo era inútil e vago.

Que o passado não era mais passado.

O passado era um presente estático, morto.

Havia poeira em tudo.

Poeira na cristaleira.

Cupins nas pesadas portas.

Lagartixas chocando nas panelas.

Ninhos abandonados.

Cobras amoitadas.

A tristeza dava as ordens o tempo inteiro.

A voz do presente morto era fanhosa.

Que lugar era aquele? Quem eram aquelas pessoas?

Ninguém tinha quinze nem vinte anos.

O sol era feito de dor, a lua feita de pavor.

A música sumira, as árvores eram outras.

As fotos ficaram ridículas.

Os loucos fugiram, desapareceram na curva da estrada desconhecida.

Quis gritar e a voz não saía.

Quis fugir e os pés viraram concreto.

Havia só o futuro.

E um enterro seguindo pelas ruas estreitas.

As cenas guardadas caíam num poço escuro.