Neve
Há milhares de pessoas numa cidade sem fim
Com os olhos voltados para uma única direção
Gente aos montes, de vida boa e ruim
Estagnadas em diferentes fluxos de circulação
É um dia branco de poucas palavras
Verdades e mentiras se escondem sob a neve
Segredos e confissões cansados das trovoadas
Enfiam-se pelos vãos onde não devem
Se o sol estivesse no céu
Talvez a comoção fosse diferente
Mas o inverno estendeu um véu
Que se enrosca feito serpente
As pessoas esquecem os lados
Perdidas em passos automáticos
Os bocejos são ensaiados
Os corações estão estáticos
Cada um desenha o próprio caminho com os pés
Todo ouvido tampado por algum tipo de som
Se fossem soltos uns poucos decibéis
Dançaríamos todos no mesmo tom
Mas que pensamento o meu!
Nada disso tem a ver com as estações
É apenas a teoria do eu
Que vai atingindo aos milhões
Dentro de uma cabine de ônibus muitos esperam
Dividem o mesmo ar gelado
Observam os flocos de neve que enterram
Qualquer esperança de um fiapo ensolarado
Ninguém resolve fazer um comentário
Alguma lembrança que veio como um tiro
Todos agem exatamente ao contrário
Engolem as palavras num débil suspiro
A solidão misturada ao frio é um sentimento dolorido
Num dia cinza em que o telefone não vai tocar
Não haverá uma voz querida falando ao ouvido
E todas as horas passarão devagar
Há tantas coisas que precisavam ser contadas
Tantos sentimentos compartilhados
Mas não existe entre todas as passadas
Um par que se aconchegue ao seu lado
De repente todo mundo ficou ocupado
A vida distribuiu o triplo de obrigações
E na pressa até o muito obrigado
Foi substituído por palavrões
Muitos correm pra chegar a lugar nenhum
É a ordinária maratona contra o tempo
Esquecem que uma caminhada de um
É solo fértil para o tormento
Eu te esperarei no mesmo lugar
Sei que somos duas pessoas comuns
Mas temos nossas memórias pra contar
E conselhos, gostaria de alguns
Então tome uma xícara de café comigo
Fale-me de um dia preferido
E eu te contarei qualquer história
Quem sabe no próximo domingo?
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