Quimioterapia

Mais uma sessão de quimioterapia,

Analgésicos pra amenizar as dores tão fortes,

Deus me abandonou completamente,

Mas não o culpo por isso,

Já que Ele é só uma idéia para se auto-consolar.

Corro para o banheiro e vomito sem parar,

São os efeitos colaterais do tratamento,

Meus cabelos estão caindo,

Só há tristeza e raiva em minha vida.

Apenas queria ser como as outras pessoas,

Amar, se divertir, trabalhar, e sonhar,

Desistir de sonhar

Porque sonhar é sofrer mais ainda

Ter esperanças é pura ilusão.

Choro pensando no filho que jamais terei,

Choro imaginando tantas auroras que não chegarei a ver,

Choro por tantos momentos e emoções que não terei chance de vivenciar,

E não há um único amigo em que eu possa abraçar,

Que possa me dizer pra não desistir,

Que me iluda com pensamentos otimistas e positivos,

Meu coração está cansado de não saber o que é realmente viver.

O médico me sorri como se tudo estivesse normal,

Ele não sabe o que é estar preso em um leito de hospital

Sentindo a morte dilacerar meu corpo.

Nem mesmo cheguei a conhecer o que é o amor,

O que seria a dor de amar,

O que seria ouvir de alguém: _ Eu te amo, e sempre vou estar contigo.

Meus pais vêm me visitar no hospital,

Mamãe segura minha mão e me pergunta se estou bem,

Não sei o que é estar bem há tanto tempo,

E eu percebo que eles tentam não chorar ao ver meu corpo tão debilitado.

Desisti de pedir um milagre a Deus,

Não tenho mais fé em nada,

A única conclusão que me espera é a morte.

O filósofo Schopenhauer disse que se "a vida é só sofrimento e dores,

Não seria a morte o melhor dos bens?"

Talvez ele esteja certo.

Quantas crianças africanas não estarão neste exato instante exalando

Seus últimos suspiros de vida, sucumbidas pela fome, por doenças e guerras?

Sei muito bem que não sou o único a sofrer e que vai morrer,

Amo a vida, porque a amo com a minha imaginação,

E na minha imaginação a vida é o arco-íris mais lindo de todo universo.

Vou caminhar sozinho através do arco-íris,

Não sei o que há por trás da cortina da Morte,

Só em pensar nisso meu corpo sente calafrios,

E minha mente se enche de pavor.

Mas como já disse o poeta Álvaro de Campos:

“Meu grande herói entrando pela Morte dentro aos pinotes,

E aos urros, e aos guinchos, e aos berros saudando Deus!”

Sim, é isso, sou o herói de mim mesmo.

Sou o herói desse espetáculo ridículo que se chama Vida,

Sou o herói de minha autobiografia que ninguém no mundo conhecerá,

Sou o herói de todas as horas e momentos fictícios que não poderei viver,

Sou o herói que não precisa usar máscaras

para dramatizar ou desdenhar a vida e as pessoas,

um herói sem máscaras,

um herói desconhecido, mas que conhece profundamente a si mesmo.

Te amei Mundo com toda avidez de meu olhar,

Te adorei Vida com toda a lucidez de meus sentimentos,

Vos deixo porque este é o destino de todo ser vivo,

Por favor, apaguem as luzes,

Estou voltando finalmente para casa,

E o sonho que lá me está reservado é um sonho lindo e eterno.

_ Mundo, em tuas mãos eu entrego o meu espírito.

É preciso descobrir quem se é de verdade

antes que o barqueiro nos leve por aquele rio

onde não se sabe a reta final.

A chama da vela, cedo ou tarde, sempre se apaga.

Obs: Dedico esta simples poesia a todas as pessoas que sofrem de Câncer, e que mesmo assim não desistem de viver. Em especial, dedico este poema a meu amigo Maurício, que morreu em 2.004 de Câncer, aos 26 anos de idade.

Fique em paz Maurício, esteja você onde estiver.