CONFISSÃO DE PAI PARA FILHO

CONFISSÃO DE PAI PARA FILHO

Abro a janela para o amanhã

e não há nisso um vestígio de esperança.

Aceito a imposição de um novo dia

enquanto aguardo a hora do pão fresco.

Vivo intensamente o nada de em seguida

como um centauro ultrapassando o mito.

O que faço não marca o acontecimento,

senão o fechamento nulíparolunar

das portas dos dias das horas do tempo.

Sento-me à mesa e repito com a fome

o golpe traiçoeiro da abastança.

Abro o jornal e devoro uma notícia

que custou um sangue anônimo qualquer.

Eu não quero ser cúmplice do mundo.

Vou ao trabalho ou não vou,

ponho a gravata ou não ponho.

Afinal eu sou o que não muda o curso

de nada segundo a minha preferência.

Qualquer alternativa é uma imposição

do agora ilhado no tempo.

O passado foi e o futuro é na cozinha

onde a carne está sendo retalhada.

Enquanto isso, $uborno com produtos

importados a viciada alfândega do coração,

malgrado os impostos escorchantes

devidos à amável consciência...

A. Estebanez

Afonso Estebanez
Enviado por Afonso Estebanez em 27/12/2008
Código do texto: T1354369
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