Anoitecer
Quero, despido de qualquer tristeza,
caminhar pela orla como caminha o vento,
que levanta a areia e verga os coqueiros,
sentindo esvair-se de mim lentamente a vida,
agonizante como agoniza a luz no fim do dia
sufocada pelas brumas do anoitecer
Quero, quando a lua já estiver alta,
no seio da madrugada fria
perder-me em letargicas lembranças,
como quem bebe sôfrego da taça fria o vinho
mesmo sabendo-o letífero veneno,
pois a lembrança é doce dor que embriaga o espírito
e produz a saudade, sofrimento maior que flagela a alma
E quando enfim a noite for se dissipando
como água que escapa da mão em concha,
quero ver a luz do sol furando as nuvens
e começar a manhã de um novo dia
inebriado e entorpecido pela insônia,
caminhando trôpego pelas dunas vazias