A POSSE DE NADA

Os caminhos que contém meus pés nesta viagem

já se retraem desejando outros passantes.

As tardes que se repetem há muito com seu por-do-sol

já não comportam o meu olhar

encompridado para o horizonte.

O canto dos pássaros trazendo alegria,

já se retrai à presença dos meus ouvidos.

As tuas mãos que se enterneciam ao toque das minhas

já se diluiram na bruma do tempo.

Inda agorinha tu dizias do contraste da cor da nossa pele,

a tua mão sobre a minha, o encontro dos olhares,

inda agorinha, descobríamos após tantos anos

o quanto podíamos ser felizes...

e agora resto eu

ímpar

deserdada

esboço ao vento

flor que já se abriu em auroras

e não consegue

se render ao refúgio do ocaso.

Busco em outras pessoas uma primavera

de papel crepon?

Juntando meus pedaços

formando mal sustentada imagem

estarei fingindo que posso recomeçar?

Existem muitos remendos nesta que um dia foi

inteira e tão pretensiosamente bela

e que agora finge não lembrar de sua sorte

já lançada

particípio mais do que passado

reservas esgotadas e sobre-vida

de risco não calculado

mutação em andamento

ave nostálgica em

derradeiro vôo de tudo ou nada

viajante com bagagem de mão, apenas,

pra curtas estadas

delírios de chama em

derradeiro clarão

nas horas do amor sem promessas!

Imagem borrada no espelho do quarto sombrio,

luz do sol projetada em renda através da vidraça

A boca em luz exposta, leve tremor nas pálpebras

ao longe nostálgico, o apito de um trem...

uma porta se abre às minhas costas

e a tarde finda, mansamente, sobre a mesa da sala...

tania orsi vargas
Enviado por tania orsi vargas em 26/11/2008
Reeditado em 26/11/2008
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