Vira-latas

Não queiras mal ao pobre “vira-latas”

Que perambula, ao léu, pela cidade,

Desconhecendo a solidariedade,

Que tanto pregas e com ela faltas.

Nasceu na lama, ao lado do monturo,

Qual verme vil que a podridão encerra,

Desconhecendo todo bem da terra,

Viu refletir no lodo seu futuro.

Desesperado, procurou guarida...

Escravizar-se a um dono ele queria,

Mas, todos lhe negavam, com ironia,

Um pouco de calor e de comida...

Só lhe restava, então, sair andando,

Expor-se ao sol à chuva, à tempestade...

A vida enfrentar com humildade

E com migalha a fome ir matando...

Não queiras mal, amigo, ao pobre cão,

Ao “vira-latas” que a miúde vês,

Ele seria bem feliz, talvez,

Se alguém lhe abrisse a porta e o coração...

Escrita em Maio de 1962.