Aurora
O vento corre atrás do tempo,
o tempo se perdeu no sonho,
o sonho se desfez na fúria,
a fúria me roubou o sono.
Estava eu, ali, parada diante do espelho,
vendo em meus olhos a flor da sorte
banhada em paz e em vermelho,
atraindo a vida, se desfazendo em morte.
Espera, doce companheira...
enquanto espero, me desespero,
mas é tudo superfície,
apenas espero;
e enquanto espero, durmo
e, portanto, espero
pra ver o sol nascer ao meio-dia.
Quão triste é a agonia...
não a conheço de frente,
procuro sempre respondê-la, ao acaso,
com risadas de sarcasmo.
Nunca me atingiu nenhuma dessas coisas más,
estive sempre de pé,
não houve tristeza que me abatesse.
E eu aprendi a escrever essas mentiras
ainda bem cedo...
mas não consegui dissimular meus sentimentos.
Há muito tempo, estava chovendo,
era uma noite morna e bonita...
toda a minha sala era coberta de luz
e o amor me enlaçava os objetivos...
Lá estava ele,
feliz, me amava...
E a chuva era mesmo linda,
e a vida tinha mesmo um rumo.
E, portanto, eu espero...
que um dia isso não aconteça de novo,
que o meu caminho se abra ao nascer do sol...
e lá no fim do meu horizonte
eu possa ver minha face.
O vento corre muito atrás do tempo,
o tempo foge muito do sonho,
o sonho impossível é a realidade,
de nós, nada será retirado,
a não ser nosso coração quando morrermos.
Você está, hoje, onde eu deveria estar...
se eu fosse você, não teria errado tantas vezes.
Mas pisar em cacos de espelho
é melhor que ver a própria imagem,
porque ninguém aprendeu a dissimular,
estamos todos enganados,
mas, no fundo, conhecemos toda a verdade.
Eu não falo muito do sol,
acho que só falo do fim do dia...
talvez eu ainda não tenha encontrado a aurora,
ela sempre se parece com o pôr-do-sol,
iluminada à luz do meio-dia.
Eu não falo muito do sol,
só falo mesmo do sal...