AQUELE TEMPO ERA DE AÇÚCAR
AQUELE TEMPO ERA DE AÇÚCAR
Criança,
ama com fé e orgulho
a terra em que nasceste!
Será que não verás
país nenhum como este?
Houve um tempo em que a escola
era uma casa de aprendiz de amor à pátria.
Os muros eram feitos de melado e rapadura.
A professora tinha lábios de sorvete de morango
e o hino nacional era cantado à marselhesa
ao pé do mastro onde a bandeira tremulava
como um troféu entre as muralhas da Bastilha.
O chão de nossa rua era de açúcar
as calçadas de torrões de chocolate
e a chuva no telhado era baunilha...
Não havia entrelinhas na cartilha
e cada herói jazia em seu lugar.
Nossos pais, de bem pouco suspeitavam
Nem a Voz do Brasil nada informava
sobre trilhas e ardis de vis tropeiros
caminhos das Bandeiras de piratas
e Capitães d’América e Mandrakes trapaceiros,
fazendeiros vestidos de jagunço de gravata,
lobisomens de araque e coronéis aventureiros
garimpeiros do Conde de Assumar...
Ah, nas crinas prateadas dos canaviais
a lua não se casa mais com o luar...
O vento deu lugar à brisa peregrina
fugitiva do fogo das usinas
tocadas pelo braço servil dos samurais.
Não têm nome de heróis os bóias-frias.
Nas galerias os heróis são generais.
A História apelidou de Tiradentes
o mártir solitário de certa independência
de quem jamais ouviu falar Coimbra,
cujo nome não consta nos compêndios
de Sorbonne...
Aqui onde nascemos e vivemos
a História dá nome às avenidas
e os becos-sem-saída não têm nome!
Porque este é o Mundo de Mrlboro
do cavalo furioso de fundo de quintal
do alpinismo genital do coiote extasiado...
Ah, o cacoete do nacionalismo alcoólico.
Oh, o cigarro top-model e o sexo oral...
O manifesto cívico e moral
do arquivo oficial da ditadura
nas entrelinhas da cartilha descartável
nas aulas de melado e rapadura...
O chão de nossa rua era de açúcar,
calçadas de torrões de chocolate...
A praça da matriz de caramelo
iluminada com bolinhas de sorvete...
Criança,
ama com fé e orgulho
a terra em que nasceste!
Será, será que não verás
país nenhum como este?
A. Estebanez