[Caso Perdido]
[Intertexo com Celina Figueiredo, "Tarde"]
"Tarde, tarde"...
Por que esta palavra insiste
em vir-me aos lábios?
Por que ela não se descola de mim,
dos meus ombros cansados,
das minhas pernas indecisas?
Por que, se aprendo a cada dia
que só me resta viver
os meus "quandos", os instantes?
Por que esta palavra "tarde"
se imiscui em meus pensamentos,
aniquila minha vontade,
se o "ontem" me apenas me criou,
e eu devo só olhar o "amanhã",
isto é, mirar a nascente das águas,
e não a foz que tudo encerra?
Mas quando cai a tarde,
demuda o canto dos pássaros,
a tristeza cinge-se ao meu peito,
e eu torno a pensar:
é tarde, bem tarde...
Tremulam as luzes,
eu sinto fervuras...
Mas ergui muros altos,
criei-me silêncios,
caminho só.
É tarde, pois...
Ah, eu sou recorrente,
sou um caso perdido!
[Penas do Desterro, 06 de novembro de 2008]