O MUNDO QUE TRAGA A GENTE
Escrito para o “mar de gente”, esta besta selvagem que aprisiona os homens nos seus enganos. Espanha, maio de 2000)
Eu temo o mar com suas ondas repentinas
Quando ele vem traiçoeiro e caprichoso
Tem a aparência de paz e é tão formoso
Com espumas tão brancas cristalinas
Por debaixo desta espuma mora a morte
E de medo meu coração se agita tanto
Quando o mar se revolve me traz o pranto
Eu contemplo o universo e espero a sorte
Só na praia é que consigo me banhar
E o ruído da água me apavora
Se estiver calmo há mais perigo nesta hora
Estou certo que está pronto a se agitar
Quanto mais calmo mais esconde o perigo
Não confio no que vejo de aparente
Pois na calma se levanta de repente
E manifesta o ardil de um inimigo
Esconderijo de lobos e de maldade
É reduto de serpentes venenosas
De sereias e fantasias escabrosas
Que produzem no meu ser ansiedade
Moro a beira do mar, nele nasci
Fui marinheiro, viajei pelas nações
Ordenei pescadores, embarcações
E outras coisas no mar eu construí
Mergulhei rincões insólitos conhecendo
O mais profundo dos tesouros que abriga
Trabalhei tão diligente qual formiga
E acabei algumas pérolas obtendo
O que achei guardo comigo qual tesouro
Mas o mar quer de volta pro seu leito
Mas a pérola está cravada no meu peito
Seu valor se estima mais que ouro
Custou-me muito suor e sofrimento
E toda onda que vem quer me tomar
Por isso temo quando olho para o mar
Não confio em sua calma nenhum momento
Todos os rios no final se afogam nele
E jamais o mar se farta de beber
Toda pérola do homem quer comer
E a riqueza dos rios é toda dele
Mas um dia secará a sua ânsia
E será como um deserto em agonia
Queimará e chorará durante o dia
E afinal acabará sua abundância
Seus poderosos navios se afundarão
Seus capitães de corveta desertores
Nunca mais cobrarão os seus favores
Os que te vêem tristes se lamentarão
Mar de gente feroz, besta selvagem
De nações, povos e línguas diferentes
Tua glória e teu orgulho hoje presentes
É o início do fim da tua imagem.