DE OLHOS E GENTE
Vi quando as águas me olharam.
Uma leve vertigem enquadrou
a timidez do seu movimento,
acrescentando-lhe brilhos dispersos
em dourado profundo.
Por baixo o tempo ecoava em verde
uma história escorrida de plantas
alongando-se em bênçãos ao mundo.
Peixes escondiam nas profundidades,
á sombra da minha curiosidade,
olhos esbugalhados por um terror inútil.
Árvores pingavam esporádicas flores,
erguendo cânticos de fecundidade
nas cores da sua língua antiga.
O momento foi perfeito.
Ali perto um asfalto preto repousava
como um monumento á inutilidade,
quase-negro, pontilhado a branco.
Longe, havia as vozes indistintas
dos homens dobrados nos campos,
invejando-me o ócio estranho.
Felizes, os meus olhos
escureciam brilhos
e guardavam tudo.
Outubro 2008