Incerta é a mão que calça a luva
Incerta é a mão que calça a luva,
Que segura a pena,
Que escreve sem parar...
Escreve em horas serenas,
Em horas amargas,
Em qualquer hora que a inspiração convidar...
Nesta vida estamos só de passagem,
Como ignorar a doce aragem
Que cheia de perfume de flores vem nos beijar?
Dizem muitos que o sentir é mutável,
Que o coração é instável,
Que se desintegra de pesar...
Quem assim pensa
Desconhece a poesia...
Nunca soube expressar,
Em nenhum dia,
Todas as singelas surpresas que a vida vem dar...
Incerta é a mão que calça a luva,
Bem sei...
Mas consciente se torna ao pegar a pena...
Quando de uma coisa tida como pequena,
Transcreve todas as rimas,
Todos os contos,
Todos os cantos,
Desilusões, tristezas, desencantos...
Que liberta a alma ao escrever...
Que se cura ao se expressar...
É disso feito o poetar...
De mente inquieta,
De sentimento bruto,
De coragem, de luta...
De pequenas coisas
(para os outros)
Que vem nos inspirar...
É isso que torna consciente a mão,
Arrancando dela a luva...
A necessidade de viver,
De crescer,
De se libertar...
É isto que faz a pena ao deslizar...
E na escrita, todo o sentir,
Aos poucos,
Começa a se lapidar...
E conforme trabalhamos,
Com a paciência de um joalheiro,
Redescobrimos um mundo inteiro,
Que havíamos esquecido de olhar...
A escrita devolve as asas que julgavamos partidas...
Nos permite exorcismos, despedidas...
Nos impulsiona a findar uma página da vida
E outra começar.