Deixem-me Beber
Deixem-me beber!
Não posso deste vinho embriagar-me,
Meu coração não pode entorpecer
Nem pode envenenar-se,
Que está já envenenado
E está a assassinar-me…
O vinho é só um disfarce
Para o meu fado.
Este olhar vazio
Não se esvaiu disperso nesta taça,
Mas foi perder a vida como um rio
Que foge de si mesmo
E perde-se no mar;
Como a perder a graça,
Perdeu-se e está a esmo
Em teu olhar.
Desatento às vozes,
Não pus na cornucópia meu ouvido
Para escutar do mar ondas ferozes;
Se fujo a esse barulho
E ignoro estrondo atroz
Tenho o ouvido perdido
Para ouvir o marulho
Na tua voz.
Ouço notas mágicas!
Não é, no entanto, a divinal bebida
Que me permite ouvir as vozes trágicas
Dos moribundos anjos
(Que em júbilo se vão…),
Mas a doce batida
Como notas de banjos
— Teu coração.