A Profissão do Ator *

* Poesia dedicada aos artistas e técnicos que fazem parte do SATED-PE (Sindicato dos Artístas e Técnicos em Diversões do Estado de Pernambuco), ao meu mestre Valdi Coutinho (pela iniciação) e à Ivonete Mello (uma verdadeira mãe para todos nós que compomos este sindicato).

Basta um sonho tecido em sons de apitos velhos

Para ver o meu destino encher-se por completo.

Basta um riso fulgaz ou lágrimas tão puras,

Somente uma vez mais, que tudo ao redor se cura.

Basta um ligeiro toque para que se tome forma:

Uma burguesa esnobe ou um chato de galochas.

Bastam que mil aplausos me aplaudam de pé.

Verdadeiros ou falsos, eu tenho mais é que ter fé!

Basta ver-me num espelho para que a lágrima caia,

Relembrando os conselhos de não ser mais um da laia.

Basta sentir o coração pulsando forte ao ver casa cheia;

Rezando minha oração, fico no bastidor a espreita.

Basta um tropeço ou risco, sem querer esquecer a fala...

Lançar-me num improviso e até arrancar gargalhadas.

Basta chorar de alegria, rir das tristezas também.

Ficar em plena euforia por meus tão poucos vinténs.

Basta subir nesse palco, aqui onde sou o que quero:

Um velho, cabelos de talco, triste mal, longe eco.

Basta ser como sou hoje, ontem, amanhã e sempre.

O show ainda não acabou, atores ainda presentes.

Basta que o bem vença o mal e declare a liberdade;

Assim que chega o final, sinto tal realidade.

O ator nunca envelhece, é espécie rara em extinção.

Seu trabalho enobrece o que defende com emoção.

Basta ver toda a gente olhando, elogiando a atuação.

Concentrado, não se encabulando, escutando com atenção.

Basta ver o brilho da platéia o que emana de pingos no olhar.

Risadas e serpentinas em festa que enchem de gozo meu caminhar.

Basta que a personagem chegue, delate-me, crave entranhas

Para que os bordões, o povo carregue, resultado de minhas façanhas.

Bastam ver as graças alcançadas transformadas em orgias:

No início, caras fechadas, renderam-se ao bem que contagia.

Basta saber que a dor se foi e que ao remédio do ator, cedeu

Que sua imagem não se transpõe, pois nenhum lhe sucedeu.

Basta ver em meus olhos rasos o destino que se encontra ao léu.

No caminhar, calculado passo; a sensação de estar no céu.

Basta apenas me fantasiar, fingir que estou em outro mundo;

Mil bordões a demasiar, extrair tudo em segundos.

Basta uma única luz brilhar que no palco serei um rei

Para fazer-te rir ou chorar quando eu mesmo nem sei.

Bento Verissimo
Enviado por Bento Verissimo em 02/10/2008
Reeditado em 24/11/2008
Código do texto: T1208209
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