TEMPO DA INFÂNCIA
Eu menina
Eu criança
E uma mãe amorosa,
Da filha toda vaidosa,
Puxa o cabelo,
Faz caracol
Faz papelote
Faz trança.
Cantava como soprano e aprendia violão.
Leoa de seu filhote.
Eu menina
Eu criança
E uma avô prestimosa,
Da neta toda prosa,
Faz saias, blusas, vestidos
De algodão, mais fresquinhos,
De organdi, mais bonitos,
De lese o primeiro sutiã.
Cozinhava como chef cordon-bleu.
Dona de casa sem falhas.
Eu menina
Eu criança
E um pai carinhoso,
Da primogênita todo ditoso,
Leva à matinê de desenhos animados
Ensina a cartilha
Conta histórias
Recita os poetas.
Fazia mesinha de estudo e versos.
Funcionário de um escritório.
Eu menina
Eu criança
E um avô genioso,
Da neta primeira orgulhoso,
Leva a passear, a pé ou de bonde,
Encanta com tiros festivos na passagem do Ano-Bom,
Dá lança Rhodia pra brincar o carnaval.
Fazia mil consertos num barracão de quintal.
Bancário.
Eu menina
Eu criança...
Travessa Maria Helena nº13,
No bairro do Ipiranga.
Tempo de quermesse, procissão, novena,
Gôsto de romã, maçã, carambola, manga,
Exuberância de árvores e passarinhos,
Gentilezas entre os vizinhos,
O armazém na esquina, leiteiro e padeiro no portão,
Tempo leve... tempo sem qualquer arranhão.
Sem carro, poucos brinquedos, muitos livros,
Tempo de fuzarcas, sem momentos sofridos.
Às margens do riacho da Independência
Viver não requeria ciência.
Era tão natural, que o tempo passou
E como o ar que respiro
No meu coração circulou.
Eu menina
Na vida criança,
Saudade...
Ah, lembrança peregrina
De bem-aventurança.
Minha infância.
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