Canção de Ninar

Debaixo da lua

Estendi minha colcha de retalhos,

Preparei meu leito de lama e ferrugem,

No chão deixei minhas roupas,

Minha pele de cera,

Minha nudez tardia.

Colhi as últimas uvas neste fim de outono,

O último sabor de vinho

Ou de vinagre,

A última embriaguez

Antes de adormecer embaixo da lua.

Mas no fundo da mata

Espreitam demônios com olhos de verruma,

Lenços de cambraia e ternos brancos.

No fundo da mata

– onde resta ainda uma porta acesa de bar,

uma mesa,

um balcão atrás do qual cochila um homem gordo –

Os demônios conversam e espreitam:

Que eles jamais adormecem debaixo da lua.

(poema do livro "UM CORPO SEM SOMBRA")