Contraponto

Tristes olhos de crianças famélicas...

Aquele olhar manso das rezes:

Diamantes negros,

Pastejando sem pressa,

As narinas úmidas, pretinhas...

Narizes escorrendo misérias verdes,

Que as desnutre e consume,

Deitadas em calçadas imundas,

Cobertas de trapos desbotados...

Os pastos de esmeralda, os trieiros limpinhos,

O descanso sereno,

Sob as mangueiras copudas,

Você já viu como elas comem as mangas?

Esticam a língua imensa,

Volteiam e revolteiam a fruta na boca,

Até largarem o caroço branquicento pelo chão...

Pobres crianças revirando lixo,

Comendo restos, disputando xepas,

Esquálidos arremedos humanos,

Fadados a multiplicar a dor,

O crime, a miséria...

Os bezerrinhos trôpegos,

Que a mãe cuidadosa lambe,

Amamenta, guia e defende dos urubus,

Dos lobos guará e dos homens...

Os órfãos e abandonados,

A promíscua realidade

Que vende virgens magrinhas,

E acolhe fetos marginais e desesperançados,

Em barrigas infantis...

Olhos e dor em dois tempos:

Um olhar à memória doce,

Outro olhar ao presente infame

Dos fatos sem solução...

Paula
Enviado por Paula em 31/08/2008
Reeditado em 31/08/2008
Código do texto: T1155393
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