Dança arritmada num domingo à tarde
I - Escolhi meu par e fui dançar
Quando fechei os olhos e pra longe
Dancei na minha confusa ilusão,
Um anjo bom e puro, não sei onde
Abraçou-me a espantar a solidão.
O anjo não tem sexo
O anjo não tem cor.
A cor provém da alma
de sexo pecador.
E dos lábios, proferidas com ardor,
Como vento aos ouvidos sussurava
Palavras de suave e belo amor.
- É um dom! - eu, que quase acreditava.
II - A Dança avançava deixando-me em transe:
E como se dentro do aconchego
Do ventre materno refugiada
As palavras guiavam-me ao eterno,
Ao eterno criador desta morada.
O Deus que não tem sexo
O Deus que não tem cor.
A cor e sexo vêm
Do Diabo pecador.
E agora em idéia impossível
Perdi do início e o fim a compreensão.
Se era homem ou mulher, já não sei não.
Pois já nem via mais o que é cabível.
Porém...
III - O Acordeon perde o ritmo:
Num estalo de um céu que relampeja
Vi a clara realidade nua e crua.
Vi o homem que vinha de bandeja
Vendendo simples doces pela rua.
Estonteada vi os postes e paredes.
Luzes e vitrines, mesas e suas redes.
Botas femininas e batas masculinas
Desperta fui igual a uma lamparina.
Lamparina que se acende quando tudo fica escuro
Que se apaga sempre no bem estar do outro dia.
E é pena, pois dessa ilusão eu já não duro.
Nem daquelas histórias, que eu dormia.
E o anjo que outrora me afagava
Na tépida névoa cinza dissolvia.
Minha mão inútil de esperança apapalva
As mãos do anjo que desaparecia.
Ao ouvido do meu par eu sussurava:
(Se era a fé ou se era anjo, não sabia).
IV - A Dança chega ao fim e o coração aperta:
Ó anjo, ó anjo que eu quase carreguei,
E de novo em confusão me encontrei.
Pra voltar à ilucidez o que eu daria?
De mim nada tem valia.
Mas Deus, como eu queria