a mesma vontade de dizer não
Os olhares correm o chão
As madrugadas trazem o suor
Da tristeza
O medo mistura-se no sangue
As palavras aprisionadas nas mãos
O vento cala a desgraça
Sopra a voz do poder
A escuridão desta pátria
Exilada na dor
Deste povo outrora sonhador
Que vive nas teias da escravidão
A voz que não se ouve
Mas que grita, crava este silêncio
Os corpos arrastados
Suspiram o dia indecifrado
A manhã que não acorda
Portugal
Já não sentes o corpo
Daqueles que te respiram
E que te moldam
À noite no vazio
Aqueles que ouvem o tumulto da morte
Aqueles que moram no pavor de outra língua
Mas que procuram anseiam o teu uivo
Aqueles que te deixam
Mas que te adoram mais que a vida apressada
Que carregam
Aqueles que te esperam
Na pele do Mundo
Aqueles que esculpiram a coragem
Enfrentaram o fogo da ditadura
Aqueles que te trazem na voz
Em palavras distraídas
Aqueles que te gritam
Que te soltam da tirania
E depois de Abril
Tens o delírio da liberdade
A madrugada perfumada de esperança
Tens o teu povo
O sonho que triunfou
Tens as feridas que não saram
Tens a seda das montanhas
Os mares de espuma
Tens a injustiça que te assombra
Que te côa a solidão
Mesmo depois de Abril
Tens a mesma vontade de dizer não
in Instinto
Cláudia Borges