a mesma vontade de dizer não

Os olhares correm o chão

As madrugadas trazem o suor

Da tristeza

O medo mistura-se no sangue

As palavras aprisionadas nas mãos

O vento cala a desgraça

Sopra a voz do poder

A escuridão desta pátria

Exilada na dor

Deste povo outrora sonhador

Que vive nas teias da escravidão

A voz que não se ouve

Mas que grita, crava este silêncio

Os corpos arrastados

Suspiram o dia indecifrado

A manhã que não acorda

Portugal

Já não sentes o corpo

Daqueles que te respiram

E que te moldam

À noite no vazio

Aqueles que ouvem o tumulto da morte

Aqueles que moram no pavor de outra língua

Mas que procuram anseiam o teu uivo

Aqueles que te deixam

Mas que te adoram mais que a vida apressada

Que carregam

Aqueles que te esperam

Na pele do Mundo

Aqueles que esculpiram a coragem

Enfrentaram o fogo da ditadura

Aqueles que te trazem na voz

Em palavras distraídas

Aqueles que te gritam

Que te soltam da tirania

E depois de Abril

Tens o delírio da liberdade

A madrugada perfumada de esperança

Tens o teu povo

O sonho que triunfou

Tens as feridas que não saram

Tens a seda das montanhas

Os mares de espuma

Tens a injustiça que te assombra

Que te côa a solidão

Mesmo depois de Abril

Tens a mesma vontade de dizer não

in Instinto

Cláudia Borges

Cláudia Borges
Enviado por Cláudia Borges em 27/08/2008
Código do texto: T1148487