Medos

Antes eu tinha medo

do gatilho e do dedo

do "cowboy" de Laredo.

Foram bons tempos em que a paúra

vinha de coisas assim

e não dos sub-americanos vestidos para o "Halloween".

Já não procuro os terrores

embaixo da cama.

De lá fugiram

com a Globalização.

Aonde terá ido o Saci das Lendas?

Quando o perdi? Nas gregas calendas?

Quem apagou o Jaguar de Rugendas?

E o Negrinho do Pastoreio?

Misto de medo, fé e anseio.

Onde ficou o medo do menino afogado

na bruta água de tanta correnteza?

Perdeu-se.

Acabaram-se as conversas ao redor da mesa.

Histórias de Horror?

Qual! Ficaram banais.

Crimes? Não. Já são triviais.

Perdi o medo da Assombração.

Acostumei-me que cá não estão.

Sumiu junto com o Dragão

e nem imagino por onde andarão.

O meu temor perdeu a Inocência.

Hoje eu temo a desrazão.

Temo o que ficamos:

alegres bobos contumazes,

pastoreados por capatazes

a soldo dos quartéis dos incapazes.

Amedronta-me a falta de Verso,

a uniformização.

A tese imposta; sem que se veja seu reverso.

Eu tenho medo que me obriguem

a brincar com o brinquedo

do qual já enjoara na infância

(E já existe tanta distância).

Apavora-me gostar de ficar quieto

e por isso ser o alvo predileto

do novo comprimido

para velho deprimido.

Eu temo o Pedinte e sua fome.

Não sei ser "Politicamente Correto"

e não sei lhe dar o nome certo.

Vejo minha bengala e me pergunto

se sou só um aleijado,

ou algo mais sofisticado

(Ficou dificil o Mundo).

Tenho medo de ser castigado

por perder a chance

de viver um novo romance.

Dizem: escute o que lhe digo:

nada lhe custará se anular

para ser chamado de amante e amigo.

Será?

Talvez sim. Talvez não.

Depende do "viés do Mercado".

Espelho do "Homem Coisificado",

humano gado a ser fatiado.

Eu tenho medo de escrever

(e de alguém ler)

e chamarem para me prender

a "equipe multidisciplinar"

que me obrigará a calar.

E tanto farão que talvez eu me convença

que qualquer viver compensa.

Ainda que falte Poesia e Medo,

deverei seguir o enredo:

só chorar em segredo.