Alucinante
nas mucosas de minha boca
ainda habitam
as salivas das palavras
que a primavera do amor floriu
eram rosas
eram cravos
espinhados
cravados na carne
era um rio de verbo
sem margens
um leito estagnado
em desassossego de parto
eram sinopses apostas a um chão
tão cru
tão vil
tão frio
eram, da terra
o cheiro
o restolho
o cio
[ciosa a liberdade
a luminosidade que se eleva
em cada anoitecer
ao largo
para além da ilha
no mastro ereto de um navio
e me bolina por ser ninfa, mulher,
vela latina… amor em flor
e esta linha reta em que me conduzo
e me velejo, onda, vaga, berço,
(o que te ofereço...)
sendo centelha breve
olhar ausente
fugidio
que se eleva e já se apaga…
se não me tocas, se não me abraças...
se me não tomas como tua.]
era
da luz a cor
o branco infinito da paz
que busco no teu corpo sereno
que anseio encontrar em teus olhos
olha-me agora
nas lembranças cravadas na memória
poeira de tua estrada
no rosto ansioso, ocioso, em espera
olha-me atento e vê
que sou a tua alma
o teu maior poema
flor se abrindo
em um outro tempo
corpo de mulher
que em inanição se queda
na amurada do desejo
- mulher de Atenas -
e, sem lágrimas,
ainda veste a força intrínseca
de ser palavra
urgente e rubra
feito semente
que germina
safra
colheita
e boca
(e)terna e sequiosa
quando, nua se escorre
imagem no espelho impetuoso
das tuas águas
e se projeta em holograma
a cada esquina do teu dia
desenhada, feito alucinação
no deserto do coração
um tudo,
um quase nada,
botão de rosa… cetim, veludo.
nas mucosas de minha boca
um beijo, um sonho
e o mundo...