Descolorir
Temi pela ausência das cores;
Cores que sempre aquarelaram meus olhos,
Fizeram-me enxergar a matiz de um mundo azul,
Pintado com cores fortes e marcantes.
As cores variavam-se diante de mim,
Mas sempre cintilavam um brilho etéreo e perene;
Em todos os cantos
Espalhavam-se os tons vibrantes;
Respirando a primavera
E sombreando os desenhos rabiscados;
Insistiam em acortinar-me a palidez do sol;
Vi, de soslaio, a paleta cair e fazer uma só cor.
Qual um retrato antigo
Enxerguei o mundo ao meu redor ao descerro dos olhos.
Em tom de sépia incursei desconfiado;
Tudo era novo:
Novos odores, novos sabores;
Novas paixões, novas dores...
Quase tudo era desconhecido,
E quase sempre frustrante.
Haviam subtraído o calor do vermelho,
Não mais havia a tranqüilidade do azul,
A imponência esverdeada corria ladeira abaixo
E até mesmo a neutralidade amarelada
Era presente apenas na furtividade da minha memória.
Lentamente percebi ressecarem-se as folhas
Em plena primavera;
Entretanto minhas lembranças traíam-me
E me faziam parecer uma tela empoeirada
Abandonada à própria sorte;
Empalidecendo dia após dia.
Deve o tempo ter ficado mudo,
Ou meus olhos calejados,
Pois o cinza que me abraçou acalentando-me
Fez as ruas similares
E todas as horas partes do mesmo dia.
Mas enquanto houver-me voz
Chegará aos ouvidos acomodados
A notícia de novas cores no mundo,
E a descoberta de novos tons em degrade.
E se ela me faltar
Esparramo a tinta pelo chão,
Nem que seja com meus olhos vermelhos.