PRIMEIRA CARTA DE INTENÇÕES (*)
Vou dizer que me envergonho
Que reluto
Mas que entrego, enfim,
E aos poucos,
Os últimos pontos.
Esta história teve início
E terá fim.
A cultura que adquiri
Os cacos de vidro nos fundos da farmácia
A infância.
“Que aventura é essa?”
- Me chamam de insolente –
Que ventura a vida me reserva?
Não afundei navios
Não trucidei pardais
Mas, daqui para a frente,
Prometo ser um menino desobediente:
Já não posso esconder que amo
A pele nua das mulheres
E que adoro e que desejo
Peitinhos em flor
Sedução de bronze e areia
Sereias do meu sonho antigo.
Um conselho eu vos dirijo
Quando levarem seus filhos à piscina
Ensinem-lhes com firmeza
A bela arte do mergulho, pois,
Na superfície,
Não há glória alguma que se sustente.
A vida que se inventa por aqui
Agarra forte, tenazmente.
É bom não controlar
Nem tente!
Viver deve ser um vício
No qual se investe.
Deixe queimar o teu cigarro
O leite deixe que vaze do teu peito
Deixe que teu corpo deite noutro corpo
Deixe consumir-se essa delícia
Consumar-se o que há de potência no Universo.
O que é vivo deixe em vida
O que é sonho deixe em verso
Deixe rolar a lágrima na pena
Deixe gastar-se a tarde no poema.
(*) Publicado, com algumas mudanças, em “O Velho Testamento, ed. do autor, 1988.