Morte Cerebral
Passa por mim o aroma,
o suave calor da neblina densa.
Afeta minhas ingênuas narinas
e traz a mim minha doce infância;
tempos de Alices e Dorothys.
Sinto-a e tento absorvê-la.
É fácil e saboroso.
Logo, alguns vaga-lumes começam a assanhar minhas pálpebras
e minhas pupilas ganham a forma do globo.
É quando mais enxergo a realidade
e por onde transpasso a barreira do certo e errado.
Agora sinto o perfume e aspereza
das flores do mal.
Percebo a dormência da epiderme
e a fuga falsa e inexata dos sentidos.
Passo por sete selos
e sete cores,
antes da chegada de um diamante louco em um céu de baunilha.
Chove em meu peito algo pesado e quente.
Meu coração reage e acelera.
O sangue chega mais rápido à cabeça
e meus pensamentos se esvaem no compasso da maré.
Hoje a lua é cheia e brilha.
Amarelada como um queijo
e alegre como burgueses em dias românticos,
em filas de hospitais e bancos.
Até a música é mais lenta
e destrutiva como o progresso estagnado em máquinas minúsculas.
Estou preso, ainda, nessa névoa serpentina.
Continuo rindo de atitudes banais
e andando a passos largos no corredor da morte.
Toco o seio inchado da virgem
e escuto o zumbido de uma mosca atrevida.
Talvez tenha esquecido de fechar a janela,
ou, talvez, ela esteja devorando meu cérebro.