A PASSAGEIRA DO ESPELHO

Um dia

- sei, saberia -

aquele espelho se assustaria

tanto com meu rosto feio,

até apiedar-se inteiro

pelo desleixo

da minha aparência triste,

que resolveu falar-me

- em segredo -

tudo, possível e impossível, para deixar-me não feio ,

para deixar de andar para trás, qual os caranguejos-de-areia,

para não mais me deixar levar como conchas-do-mar, pelas ondas.

A barba na mesma cara

- disfarçada -

cansada por nada mais poder fazer pela pouca face,

deixou-se crescer;

o cabelo mais escasso

- desaparado -

cumprindo a regularidade do deitar e dormir sobre os ombros,

encompridou-se sem querer.

Um dia,

- saberia, sim! -

entenderia tanto o mistério do espelho

que, como ninguém, queria me ver de rosto bonito

que acabei, sem querer, encantando-me por ele

sem nada precisar lhe falar

- nem em segredo -

do sentimento de amor à primeira vista:

havia uma mulher na morada deste espelho!