BALADA AO IRMÃO ESTUDANTE

ah, irmão estudante,

você tão só,

multiplicador de outros tantos

que não irão pensar em riscos de vida:

no afã das idéias

- Galileus -

do amanhã.

ah, irmão estudante,

você tão só,

cercador e cercado por tantos

cerceadores ou libertadores da palavra:

boato ou notícia

- desmentido –

num rodapé.

Cadê sua rebeldia,

sua vontade própria

de fazer democracia com democracia,

falando o que lhe venha à telha

mesmo que o teto lhe desabe sobre a cabeça.

O cidadão comum,

estudante amigo,

de farol escuro, de salário mínimo, de estima baixa,

cansado de tudo: dos fatos e dos fardos,

não indiferente às reivindicações,

entendem e lhe falam alto,

sem voz de prisão.

Irmão e amigo,

ouça nem sempre o que quis dizer:

ser a cara da coroa ou a coroa da cara

- meio sorte, meio azar -

é tão relativo quanto o dez máximo

sem desgrudar o umbigo da carteira,

e, da vida, nada aprender.

Se sua média for a da mesma classe,

não aceite cola ou sugestões,

para tornar melhor todo o universo

de questões do coração

numa só prova.

O tempo da certeza

- demora, mas aparece -

tenha você deficiência visual, dislexia,

mau café da manhã, pais desajustados,

arrimo de família, maior desconcentrado.

É difícil achar a causa do mau aprendizado.

Colega, irmão estudante,

é chatíssimo cantar toda manhã

- na decoreba -

o Osório Duque Estrada,

ler com ufanismo

- piegas -

do Gonçalves.

Mas, como em toda história,

há uma moral ou lição de anarquia:

por pior que aqui esteja, não será melhor que lá!

Apanhei dos companheiros,

estudante de poucos livros,

apesar de, involuntariamente, ter lido todas as cartilhas

no tempo em que nem havia rodapés.

Calar, irmão amigo,

é bem melhor que bater sem ter motivo

e pintar a cara sem ver a cor do time do coração.

Falar por falar,

- sem convicção -

é pura perfumaria da palavra, amigo-irmão!

ah, irmão estudante,

compreendo todo seu direito de ter ido embora do Brasil

e de ter voltado com a mala mais cheia de saudade.

Admiro sua coragem do sonho ilhado,

amigo estudante,

distante de todos os conflitos,

do perfeito, da utopia

de falar fluentemente sem enrolar a língua

por ter amantes sem cor e sem sal,

só para ser a companheira.

Não dite, irmão estudante,

o comportamento de tudo já escrito,

apesar de ser indispensável a literatura

do Sartre, do Kardec, do Amado, do Freud, do Cervantes, do Arrabal,

não tente ser purista ao assimilar só o que lhe interessa.

Leia tudo o que lhe bata à passarinha,

mesmo que o dito contradiga

os abcês do modismo.

ah, amigo estudante,

muito cuidado com o coco dos pombos:

e com os panfletos

que tanto já lhe caíram à cabeça,

e, por sorte, não lhe provocaram amnésia parcial.

Divergências serão sempre necessárias,

irmão estudante,

na vida, na arte, na contestação, na cumplicidade

de quem, fatalmente, um dia saberá concordar.

ah, irmão estudante,

cheio de raízes,

informaram-me

[há pouco]

que você deveria saber

do Ziraldo a criar projeto pra crianças,

do Millôr que continua rabiscando,

que Paulo Pontes voltou a ser encenado,

que quem contribuiu para a história não morrerá esquecido

como você, tão bandido,

banalizando como um estudante primário,

de rodapé manifestado.

Respeito-lhe tanto,

irmão estudante,

pela Pátria que você, até, pode não ver!