amei-te
amei-te
dizia ele
sentado sobre a morte a tracejado dela
e o silêncio desceu límpido e feroz
na combustão dos corpos
a terra abriu-se pontuando cada mancha de sangue
os espelhos cercavam o ar
que se deixava arrefecer num instrumental de dor
ela numa anestesia que lhe enfeitiçava o rosto
deixava-se levar na sua própria música
ligeira
com aroma de pérolas molhadas
os nomes cortavam-se
e aqueles lábios anónimos queriam-se
num esquecimento rápido
amei-te
quando a roupa se ordenava
na coesão dos dias
e sabíamos transformar o mundo
no tacto da pele
agora
emerges onde a minha voz não te alcança
e pálida segues o rasto suado
as nossas bocas separam-se
tingidas da nossa velha loucura
amei-te
e éramos um colar cinzento
no fluir do medo
abraçados na música dos órgãos
repartindo as sílabas nos pulmões dos moinhos
retoca esses longos olhos
enquanto eu me esqueço dos leques rodopiantes
que agitam os nossos beijos
e dos trapézios graves
que desfaziam as almofadas
entendo apenas a seiva dos relógios
que constrói salões de mel no meu peito