COLÍRIO ALUCINÓGENO
prendo o barco na margem
o que falta além do ocular
me derramo sincero
já não tenho mais o que esconder
nunca tive o que esconder
pois o que está oculto
liberto se tornou pelo fato oculto
o que está suplantado
é sinal da hereditariedade
fruto de uma nova forma
de uma nova idéia
que não requer subjetividade
e não se submete ao caos
é algo que faço além
que não está antes e nem depois
e que no hoje nada é
é vida
e como tal é mistério
é simulacro de palavras
o mistério não está aqui
não está além do tudo
é apenas fluxo inconteste
é o Deus antes de si
é a natureza
em sua natureza mais primária
quase um arbítrio aleatório
ou um sentido semiótico
ou idiotice mesmo
ou uma interpretação contagiada
um fôlego cambaleante
sentimento de quem possui sonhos
e os frutos deste se esvaem
na certeza de que o real
é tão real
que transforma a ficção em real
e tudo se mescla num guisado
numa epilepsia santa
numa simulação da vida
despreocupada em sentir
despercebida do gozo
da saliência protuberante
do silvo que se insinua
do sexo açodado de sabor
e da eclosão nuclear
que transborda as barreiras
que gera nas linhas uma falácia
que não precisar ser arriscada
pois é risco certo
pois é vida antes da morte
pois é morte antes do óbito
e nada é tão desleal
e fiel a uma lógica
que foge aos conceitos matemáticos
pois pertence à vaga tradição
e não possui nenhuma intenção
e fere minha ilusão
 tomara que o analgésico funcione
e eu consiga dormir 